Riscos psicossociais: por que ignorar a mente da equipe vai custar caro.

A nova NR-1 exige gestão de riscos mentais. Saiba como evitar passivos e multas agora.
Publicado em:
16/12/2025
Categoria:
Trabalhista

Durante décadas, a segurança do trabalho foi visualizada quase exclusivamente através de equipamentos de proteção tangíveis: o capacete que protege da queda de objetos, o protetor auricular que isola o ruído da máquina ou as luvas que barram agentes químicos. No entanto, o ambiente corporativo moderno trouxe à tona perigos que não podem ser contidos por EPIs físicos.

Com a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), oficializada pela Portaria MTE nº 1.419/2024, o legislador brasileiro reconheceu que a saúde mental do trabalhador é um ativo a ser protegido com o mesmo rigor da integridade física, tornando obrigatória a inclusão dos riscos psicossociais no Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO).

Essa mudança representa um divisor de águas na gestão empresarial. Se antes o bem-estar psicológico era tratado como um diferencial de "brand employer" ou "salário emocional", agora ele ingressa na esfera da conformidade legal obrigatória. A gestão de riscos psicossociais deixa de ser opcional para se tornar um passo fundamental para a sustentabilidade corporativa e a prevenção de passivos trabalhistas. Gestores e departamentos jurídicos precisam desenvolver novas competências para identificar e mitigar ameaças que, embora invisíveis a olho nu, possuem um potencial destrutivo imenso para o caixa e a reputação da empresa.

O que define, afinal, um risco psicossocial?

Para adequar-se à norma, é preciso primeiro compreender que o risco psicossocial não é uma abstração subjetiva. Diferente dos riscos físicos, como calor ou ruído, estes fatores estão intrinsecamente ligados à organização e à gestão do trabalho. Estamos falando de elementos concretos do dia a dia corporativo que, se mal administrados, geram adoecimento físico ou psíquico.

A norma e as diretrizes técnicas apontam para situações muito comuns, como a sobrecarga de trabalho derivada de metas inatingíveis ou jornadas exaustivas, e a falta de autonomia, onde o colaborador se vê impossibilitado de influenciar a execução de sua própria tarefa. Além disso, a deficiência no suporte da liderança e a má gestão de mudanças organizacionais — aquelas alterações bruscas sem comunicação prévia — também compõem o quadro de riscos que agora devem ser mapeados.

A sobrecarga de tarefas e a falta de clareza nas metas deixaram de ser apenas problemas de gestão para se tornarem passivos trabalhistas monitorados por lei.

A falsa sensação de tempo e o cronograma de fiscalização

Uma das armadilhas mais comuns no mundo corporativo é a procrastinação baseada em prazos legais distantes. A Portaria MTE nº 765/2025 trouxe um cronograma escalonado, definindo que a fiscalização efetiva e a vigência do capítulo referente aos riscos psicossociais iniciarão apenas em 25 de maio de 2026. À primeira vista, pode parecer que a empresa tem um longo período de "folga", mas essa interpretação é perigosa.

Adequar uma fábrica à norma de segurança elétrica exige engenharia e reforma, algo que se resolve com projeto e obra. Adequar uma empresa à gestão de riscos psicossociais exige mudança de cultura organizacional.

Implementar canais de denúncia confiáveis, treinar lideranças para abandonar práticas de assédio travestidas de "cobrança forte" e reestruturar cargas de trabalho são processos que demandam tempo de maturação. Deixar para iniciar esse movimento em 2026 é a receita para enfrentar fiscalizações com uma estrutura imatura e vulnerável.

Atenção às exceções: a armadilha para médias empresas

Muitos empresários de micro e pequeno porte acreditam estar isentos dessas obrigações devido ao tratamento diferenciado previsto na lei. De fato, Microempresas (ME) e Empresas de Pequeno Porte (EPP) de graus de risco 1 e 2 podem estar dispensadas de elaborar o documento físico do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) se declararem a inexistência de riscos físicos, químicos, biológicos e ergonômicos. Contudo, existe uma "letra miúda" crucial aqui.

A dispensa do documento PGR não isenta a empresa de realizar a Análise Ergonômica Preliminar (AEP). Como os riscos psicossociais são, por natureza, fatores ergonômicos, sua avaliação continua sendo obrigatória através da AEP, conforme determina a NR-17. Portanto, acreditar que o porte da empresa serve como escudo contra a gestão da saúde mental é um erro jurídico que pode custar caro em uma eventual reclamatória trabalhista.

Mesmo empresas dispensadas de certos documentos burocráticos continuam obrigadas a avaliar e mitigar os riscos ergonômicos e psicossociais de suas equipes.

Estratégias de blindagem jurídica e gestão

Para navegar nesse novo cenário, a postura da empresa deve ser proativa. O objetivo não é apenas cumprir uma tabela do governo, mas constituir prova de boa gestão e prevenir alegações de assédio ou danos morais. Recomendamos fortemente a criação de políticas claras, materializadas em um Código de Conduta rígido que abomine expressamente o assédio moral e sexual.

No entanto, o papel aceita tudo; a prática é o que conta. Por isso, a implementação de canais de denúncias seguros e, fundamentalmente, sigilosos, é vital para que a empresa tome conhecimento de abusos antes que eles virem processos judiciais. Paralelamente, é necessário investir no treinamento contínuo dos gestores. Muitas vezes, o risco psicossocial nasce de um líder despreparado que confunde autoridade com autoritarismo. Capacitá-los para uma liderança saudável é a primeira linha de defesa da organização.

Um canal de denúncias efetivo e sigiloso atua como um sistema de alerta precoce, protegendo a empresa e seus colaboradores de condutas abusivas.

Considerações finais

A atualização da NR-1 não deve ser vista apenas como mais uma burocracia estatal, mas como um reflexo da evolução das relações de trabalho. A gestão dos riscos psicossociais é, hoje, um pilar fundamental para a sustentabilidade corporativa. Empresas que investem na saúde mental de seus times não apenas cumprem a lei, mas também reduzem o absenteísmo, aumentam a produtividade e se protegem contra altos passivos trabalhistas. O invisível agora é visível para a lei, e ignorá-lo deixou de ser uma opção.

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